ANTES TARDE DO QUE NUNCA – Brasil avança em vacina contra coronavírus; chegada do medicamento ao mercado pode levar três anos

A iniciativa brasileira é conduzida por um laboratório de imunologia da USP

Foto: Arquivo Pessoal

Cientistas brasileiros trabalham, desde fevereiro, no desenvolvimento de uma vacina para o novo coronavírus, que causa a Covid-19. Já fizeram avanços importantes, que os deixam próximos do início dos testes, mas a chegada dela ao mercado deve levar três anos.

“É desolador, mas o que se pode fazer? Eu gostaria que isso ficasse pronto em um mês. Mas tem que fazer os experimentos. Teoricamente, eu te dou a vacina amanhã e você produz, mas antes eu tenho de ver se funciona”, afirma Jorge Kalil, médico de 66 anos que chefia o Laboratório de Imunologia do Incor (Instituto do Coração), da Faculdade de Medicina da Universidade da Universidade de São Paulo (FMUSP).

Kalil lembra que, mesmo que outros países cheguem a um resultado antes, é muito importante haver desenvolvimento de uma vacina nacional para que o Brasil não fique à mercê de outros para atender a população. “Imagina que o governo brasileiro desenvolva uma vacina. Você acha que vamos vender para os EUA? Não, vamos fazer vacina e imunizar os brasileiros”.

Os efeitos do coronavírus são algo que o médico conhece bem, não só por estar à frente do projeto de elaboração da vacina. Seu filho pegou Covid-19 e, por isso, Kalil foi colocado em isolamento social por precaução. Isso não significa que ele passou a ficar mais perto da família. Sua rotina de trabalho é de até 14 horas por dia. “Só dá tempo de me alimentar e dormir. Pergunta para minha esposa. Ela fala que eu não saio do computador, que eu não falo com ninguém”, contou.

É uma corrida internacional. Ao redor do mundo, há diversas iniciativas que buscam a vacina, cada uma em um grau de desenvolvimento. Kalil estima que os laboratórios que começarem a testar em humanos devem concluir seus trabalhos dentro de um ano e meio a dois anos.

A expectativa é similar à da OMS (Organização Mundial da Saúde). “A vacina ainda demora pelo menos 18 meses. Enquanto isso, reconhecemos que há uma necessidade urgente de terapêutica para tratar pacientes e salvar vidas”, disse o diretor-geral da entidade, Tedros Adhanom Ghebreyesus, na semana passada.

Exemplos disso são a Universidade de Pittsburgh, que anunciou ter chegado à fase de teste em camundongos, e a Johnson & Johnson, que planeja iniciar testes em humanos em setembro.

A Vacina

Sabendo da urgência da situação, o Incor adotou uma estratégia que acelerasse a criação da vacina. A ideia é criar uma partícula semelhante ao coronavírus, chamada de VLP (sigla em inglês para “virus-like particle”), que funciona como um vírus oco, sem o material genético do coronavírus dentro. Isso tira a capacidade de transmissibilidade da Covid-19, o que torna seguro usar em vacinas.

“É uma forma rápida de fazer e bastante imunogênica, desencadeia boa resposta imunológica do indivíduo”, afirma o médico responsável, acrescentando que esse método já foi adotado outras vacinas, como as de papiloma vírus (HPV) e hepatite. Algumas abordagens seriam mais demoradas. “Fazer com vírus atenuado levaria anos, porque ele tem que estar fraco, mas não morto. É um problema testar se está fraco para todo mundo”.

Outras não possuem histórico comprovado de que dão certo. É o caso da vacina desenvolvida nos Estados Unidos, que usa uma ferramenta genética para reproduzir uma sequência de DNA. Ela insere partículas sintéticas de mRNA (o RNA mensageiro) do vírus no organismo humano, o que leva o corpo a produzir anticorpos contra o invasor.

Usar VLTs, porém, produz respostas mais robustas do organismo. Por isso, os cientistas estão focando em inserir no VLT a espícula, a parte usada pelo vírus para infectar células humanas, para que o organismo gere anticorpos contra ela.

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